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Sucesso da Austrália no combate à Covid-19: como o país conseguiu superar a pandemia

Com um óbito pela doença em 2021, governo se destaca por controlar os casos; economia está se recuperando e os cidadãos relatam sensação de tranquilidade


Por: Alexandre Aleixo, Gabrielle Lima, Jefferson da Silva, Leonardo Messias, Lucas Silva, Lucas Tertuliano e Pedro Lucas Costa


Com aproximadamente 30 mil casos e 910 óbitos confirmados por Covid-19, tendo registrado apenas uma morte pela doença em 2021, a Austrália se destaca pelo êxito no controle da pandemia quando comparada a outras nações. A imposição de rígidas medidas de contenção e distanciamento desde os primeiros casos, a disciplina e consciência dos cidadãos e até alguns privilégios geográficos podem ajudar a explicar o sucesso do país no combate ao coronavírus.


O brasileiro Felipe Andrade, que trabalha com construção civil e mora em Sydney, considera que a disciplina e seriedade como a população australiana encarou o vírus desde o início fez total diferença para o êxito em seu combate.


“Aqui na Austrália todo mundo se preocupou muito, não só consigo, mas com as pessoas ao redor, família, amigos. Todo mundo considerou o Covid como um vírus muito forte desde o início. Com todos conscientes do que estava acontecendo, tivemos a oportunidade de reagir mais rápido”, relata Andrade.

Desde o final de janeiro de 2020, quando o primeiro caso do novo coronavírus foi identificado no país, as autoridades australianas agiram com muita rapidez para frear a disseminação da doença em todo o território nacional. A primeira grande medida de contenção tomada pelo Governo Federal foi barrar a entrada de imigrantes chineses no país. Naquele momento, a China era o epicentro da Covid-19 no mundo, além de ser o local onde o primeiro caso foi registrado. Posteriormente, o Governo decidiu fechar as fronteiras para todos os imigrantes estrangeiros.


É preciso lembrar que apenas a entrada de pessoas com outras nacionalidades foi proibida. Os cidadãos australianos que estivessem fora e precisassem voltar à Austrália tiveram sua chegada permitida, mas todos seriam obrigados cumprir um isolamento de 14 dias, para garantir que, caso estivessem infectados, não espalhassem a doença dentro do território nacional. Durante esse período de quarentena, as pessoas também deveriam comunicar as autoridades caso sentissem qualquer sintoma da Covid-19.


Essa política se mostrou tão eficiente que foi implementada em março do ano passado e se mantém até hoje, ainda sem previsão de término. O Governo local inclusive declarou que não pretende reabrir o país para estrangeiros em 2021.


Felipe relata quais medidas de contenção afetaram a vida dele. “As medidas aqui foram muito fortes. Assim que a pandemia chegou o Governo começou a agir. Eu lembro que todos os estabelecimentos não essenciais ficaram fechados, não era permitido visitar nenhum parente nem amigo, o uso de máscara era obrigatório em todos os lugares, e houve uma fortíssima fiscalização da polícia com relação a isso a todo o momento”, ele diz.


Na avaliação do engenheiro, a pandemia poderia ter tomado outro rumo no Brasil caso a população tivesse sido mais cuidadosa.


“Acho que no Brasil houve uma demora de conscientização, de entendimento de que o vírus poderia trazer muitas mortes. Creio que esse tempo de demora causou números tão elevados. Uma grande porcentagem da população não cumpriu as regras de isolamento social para que o vírus pudesse ser contido”

O êxito desse tipo de medida foi potencializado pelo fato da Austrália ser uma ilha, ou seja, não tem nenhuma fronteira terrestre com outras nações. Assim, o controle e fiscalização da entrada de novas pessoas no país tornaram-se muito mais facilmente monitoradas pelo Governo, visto que elas só podem acontecer através de portos e aeroportos.


Mas além do fechamento das fronteiras, uma série de outras medidas foram tomadas pelas autoridades locais. Vários lockdowns em regiões com casos confirmados (inclusive com a proibição de visitas a outras residências), toques de recolher, fechamento de comércios, proibição de reuniões e eventos, fechamento de divisas de estados, entre outras.


Comparação com os Estados Unidos


Nem todos os países tiveram tanto sucesso no combate à pandemia quanto a Austrália, longe disso. Os Estados Unidos, por exemplo, passaram por maus bocados causados pela Covid-19. Em abril do ano passado, os EUA enfrentaram uma transmissão descontrolada do vírus e bateram recordes de casos e óbitos pela doença. O número de mortes diárias chegou a 2752 no pico dessa onda.



O estado de Nova York foi um dos que mais sofreu, vendo seu sistema de saúde superlotado, a beira do colapso. Hospitais de campanha tiveram que ser montados às pressas e o número de enterros e cremações chegou a aumentar 300% nas regiões mais afetadas.


No fim de 2020 e começo de 2021 o país enfrentou uma nova onda de coronavírus ainda mais devastadora. Os números bateram novos recordes, as mortes diárias passaram de 4 mil e os novos casos passaram de 250 mil.


Para a bancária Neusa Magalhães, moradora da Califórnia há mais de 20 anos, o Governo Federal agiu bem no início, mas depois deveria ter esclarecido melhor o que deveria ser feito para a população.


“Achei que o Governo atuou bem no começo, ajudou dando um cheque a cada família, mas depois perdeu o controle. No início as pessoas respeitavam o isolamento, mas depois como o próprio Trump não respeitava e não incentivava acabou virando uma bagunça”, conta Neusa.

A situação só melhorou conforme a quantidade de aplicação das vacinas cresceu. Hoje, os Estados Unidos são um dos países que mais vacina no mundo em números absolutos (só atrás da China), já são mais de 280 milhões de doses aplicadas, e algumas regiões até oferecem recompensas para quem se imunizar, como bebidas, ingressos de eventos e até quantias em dinheiro.


“Esse Governo atual conseguiu recuperar o tempo perdido com as vacinas e vem fazendo um trabalho excelente, esse presidente conseguiu colocar ordem no país com a vacinação em massa”, diz Neusa.


O número de casos vem caindo desde janeiro e o de mortes é o menor desde os primeiros dias da pandemia no país, cerca de 600 por dia. A situação fica cada vez mais controlada por lá e as expectativas para o futuro são boas. “O país está se recuperando bem com a vacinação quase completa. Os empregos estão aparecendo... Acredito que até o final do ano já estaremos recuperados”, declara a bancária, com muito otimismo.


Impacto Econômico e Social


As medidas de proteção sanitárias realizadas para o combate da Covid-19 possibilitaram que a vida cotidiana retornasse significativamente. Fronteiras fechadas e o lockdown foram ações que o país tomou rapidamente para diminuir o alastramento do vírus.


A pandemia conseguiu provocar a primeira recessão do país em três décadas de crescimento. Com as restrições provocadas pelo vírus, o banco central reduziu as taxas de juros para auxiliar as famílias e empresas. Os incêndios florestais, que aconteceram em 2020, prejudicaram o turismo e os gastos de consumo em partes, segundo a Australian Tourism Export Council. Porém, com o fechamento de hotéis, restaurantes e outros comércios, o consumo e, consequentemente, os gastos das famílias diminuíram 18%.


A Austrália destinou cerca de 13% do PIB (Produto Interno Bruto) do país em gastos fiscais investidos na contenção das lesões causadas pelo vírus, com auxílios para pessoas desempregadas. O PIB do país caiu 0,3% no primeiro semestre de 2020, e 7% no segundo. Apesar da economia ter sido abalada no primeiro período, a ajuda dada pelo governo às pequenas empresas, lojistas e pessoas que perderam sua renda, evitou o colapso. O país fechou o ano com uma queda de apenas 2,5% do PIB, um número muito menor do que outros países que tiveram mais dificuldade de conter o coronavírus, como, por exemplo, a Itália, que registrou uma queda de 8,9%, e a Argentina com 9,9% de recuo.


O economista Luciano Caricol Iaralham explica que o apoio do governo à população é fundamental para a economia não parar.


“A economia vai bem quando o dinheiro circula, quando ele passa de mãos em mãos para todas as pessoas. Quando o governo injeta dinheiro na população para se alimentar, pagar suas contas, mesmo com uma grande parcela ficando em casa, além dos reflexos da economia direta, isso afeta também a economia indireta. O governo injeta dinheiro para fazer o dinheiro circular, e todo mundo acaba ganhando com isso", explica Caricol.

Medidas possibilitaram que as pequenas empresas crescessem com as vendas on-line em 20%. O programa JobKeeper doou 11,5 bilhões de dólares, e o programa federal HomeBuilder abriu linhas de crédito, e financiaram as reformas em moradias. O PIB do país também já voltou a crescer em 2021.


Caricol usa o Brasil para exemplificar as consequências de atitudes contrárias a essas. Ele diz que invés de uma política única e direcionada com o intuito de salvar vidas, o foco do Brasil não foi único, mas com direções divergentes que entravam em conflito e não lidavam em si com o problema principal, a saúde pública. As atenções eram divididas entre problemas de corrupção, crises políticas e econômicas, e interesses financeiros, resultando na morte de milhares de pessoas.


“Acredito que a vacinação em massa seja a alternativa para que a população possa voltar ao normal, mas estamos atravessando, de fato, uma guerra, e a politicagem está sendo a grande vilã do processo."

As medidas rápidas de restrições e apoio à população justificam o êxito no combate à Covid-19 na Austrália. Após apenas um registro de morte pelo vírus desde dezembro de 2020, o país já conseguiu realizar, no começo de 2021, festivais de música com presença de mais 13 mil pessoas, eventos esportivos com público e reuniões privadas com até 200 pessoas. Os bares e restaurantes aumentaram a capacidade do público em 75%.


Banda Midnight Oil faz show para 13 mil pessoas, em março, na Austrália (Foto: Divulgação/Facebook)

“Em comparação com o ano passado, esse ano está muito melhor. Há muito menos restrições. Pessoas estão se sentindo muito mais confortáveis, elas não estão mais tão preocupadas. Os empregos estão se recuperando, a economia está se recuperando”, diz o australiano Andrew Smith sobre o afrouxamento dos cuidados.


As medidas ainda continuam em várias partes do país, restringindo a entrada livre de estrangeiros e mantendo as medidas de distanciamento. Os moradores relatam a vida mais leve, mas ainda com cuidado.


“O governo não quer que a gente tenha uma falsa sensação de segurança e eles ainda querem que nós mantenhamos o distanciamento social, eles ainda querem que nós tenhamos confiança para que sejamos vacinados para termos a imunidade completa", revela Smith.

A socióloga Sueli Gama, em uma visão comparativa, disserta sobre como a falta de políticas públicas e um apoio governamental implicam na situação atual brasileira.


“Infelizmente o Brasil é um exemplo clássico da incompetência na política de combate ao coronavírus, vemos desde o início da pandemia, o número de infectados e mortes crescendo diariamente, a crise econômica afetando milhares de brasileiros, a desigualdade social que já era enorme, ficando cada vez mais latente”.


De acordo com a especialista, os inúmeros fatores negativos que geraram a crise na saúde pública necessitam de uma intervenção sociológica para gerar um debate amplo para a população.


“Cabe à sociologia potencializar os estudos sociais, com vistas a encontrar soluções para os problemas enfrentados pelos grupos sociais. A pandemia é um destes problemas, que exige estudo, políticas públicas eficazes e participação social consciente e ativista, com vistas para uma sociedade melhor para todos”, reforça Sueli.

Para os especialistas como Sueli Gama, medidas públicas eficientes para restringir a circulação certamente fizeram com que a Austrália se tornasse um modelo de combate à pandemia. Com a imunização em massa e a colaboração das pessoas, essas ondas de otimismo e a tranquilidade podem atravessar o oceano e chegar ao Brasil também.




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