Consulados e embaixadas de torcidas brasileiras recepcionam torcedores no exterior
Por: Aryanne Leal, Byanka Mendes, Caroline Devides, Isabella Gaino, Karol Lima, Mauricio Rodrigues e Thiago Calamari
Brasil. O país do futebol. Uma nação entregue aos traços culturais de um esporte que move gerações e ultrapassa fronteiras. O futebol acompanha os brasileiros, onde quer que eles estejam, inclusive, fora do Brasil.
Segundo dados de 2020 do Itamaraty, o número de brasileiros no exterior chegou a 4,2 milhões. Um aumento de 16% em relação a 2018. E vários podem ser os motivos para a justificativa desses números, desde o cenário político e econômico no Brasil, até a busca por melhoria na qualidade de vida, imersão cultural, e experiências acadêmicas e profissionais.
E é neste momento que surgem os consulados e embaixadas das torcidas brasileiras, difundindo seus times pelo mundo e recepcionando torcedores no exterior. Verdadeiras comunidades que se reúnem para assistir aos jogos, organizam encontros e promovem ações de responsabilidade social.
Tarso Gouveia, Vice-Presidente da Sociedade Esportiva Palmeiras, com mais de 30 anos de dedicação profissional ao clube e principal nome dos consulados alviverdes, conta que “o objetivo principal é aproximar o clube do seu torcedor. É muito gratificante ter pessoas que estejam viajando por outros países e terem lugares para confraternizar e assistir aos jogos do seu time do coração”.
Os encontros se revezam entre as próprias casas, bares e restaurantes. O importante é reunir, no mais profundo significado da palavra, “tornar a unir o que estava junto e se separou”. E essa tarefa cabe ao cônsul, de fazer a ponte entre os torcedores da sua região e a equipe, revitalizando laços que se conectam por uma única paixão e reverberam no mesmo sentimento de amor à camisa.
“Isso não tem preço, a gente faz pelo amor à Sociedade Esportiva Palmeiras, não tem tempo ruim, tudo que fazemos é pelo clube, é mais gratificante assim, quando a gente se reúne e se ajuda. Em dia de jogo a gente tenta fazer um clima de arquibancada no bar. Temos bateria, bandeira, cerveja. Nós buscamos fazer como se estivéssemos em casa, aos arredores do Allianz Parque, a verdade é que o Palmeiras nos une demais”, expressa Vinni Dias, Diretor do consulado Palmeirenses in Sydney.
Além de atrair os torcedores de cada cidade, levar o conhecimento do time em outro país, difundindo e fortalecendo a marca do clube em solo estrangeiro, também é um fator importante para a consolidação da torcida.
Os consulados apresentam aspectos organizacionais que chamam a atenção e acabam sendo vitais na construção da identidade visual e logística da torcida, bem como a composição de uma diretoria, a criação de um logotipo e a escolha de um Quartel General (QG).
Neste contexto, grandes times do Brasil contam com representações no exterior. O Flamengo, por exemplo, apontado como o clube brasileiro com maior torcida do Brasil em 2022, pela pesquisa da Sports Track, conta com mais de 43 consulados fora do país. Logo atrás vem o Palmeiras, com 22. O Corinthians completa o TOP 3, com 15.
Mengo, estou sempre contigo!
“Eu teria um desgosto profundo se faltasse o Flamengo no mundo”, é o que diz trecho do hino do time carioca. Fundado em 1912, o Clube de Regatas do Flamengo possui mais de 32,5 milhões de torcedores no país e ao redor do mundo. E em Lisboa não é diferente. A Fla-Portugal carrega a bandeira rubro-negra pelo país e perpetua o amor flamenguista na cidade portuguesa.
A paixão pelo clube fez com que um grupo de amigos se juntasse para assistir aos jogos em Portugal, já que estavam longe do seu time do coração. Mas essa paixão era tão grande, que acabou virando um consulado. “Gostávamos muito do Flamengo e precisávamos de um lugar para assistir aos jogos. Nós começamos a nos reunir em um lugar pequeno e tivemos a ideia de criar um consulado. Depois disso, fizemos contato com o clube e a história vingou. Com o tempo, o consulado foi crescendo e conseguimos virar uma embaixada.” conta Leonardo Mesquita, diretor da Fla-Portugal.
Os encontros são marcados de acordo com os jogos da semana. Toda a divulgação é feita no Instagram do consulado, além do grupo de WhatsApp, que contém as demais informações relevantes sobre a sede, localizada nas Docas de Alcântara. Há quem pense que o fuso horário do Brasil para Portugal atrapalha a reunião do grupo para a transmissão dos jogos. Mas para Leonardo, isso é apenas um detalhe. “Muitos jogos são de madrugada, mas não importa, estamos sempre lá, qualquer jogo estamos lá. Sempre tem muita gente nova chegando, e podem chegar! É só chegar!”.
O sentimento e a responsabilidade de carregar a bandeira rubro-negra Brasil afora vai muito além do amor à camisa. “Nos dá muito orgulho ver que tem muita gente que nem conhecemos, mas se tornam amigos. Os flamenguistas chegam de todos os lugares do Brasil e do mundo para curtirem os jogos com a gente e isso é muito gratificante”, diz Leonardo.
Depois da chegada de Jorge Jesus ao Flamengo, muitos canais televisivos portugueses passaram a transmitir os jogos do clube. Isso fez com que a alegria do brasileiro, que já é prá lá de contagiante, se espalhasse ainda mais por Portugal. “Os portugueses amam a gente porque fazemos essa “bagunça”, essa alegria do brasileiro em gostar do futebol. A embaixada é frequentada por muitos gringos que passeiam e vem conhecer Lisboa, os portugueses também. As próprias torcidas dos clubes daqui também ficam admiradas com a nossa energia. Já colocamos muitas pessoas em eventos daqui e eles gostam muito” complementa o diretor da representação flamenguista em Portugal.
Atualmente, o Flamengo possui um departamento especial que cuida da parte de consulados e embaixadas pelo mundo. Criado dentro do programa de sócio torcedor, hoje é o departamento que mais cresce dentro do clube carioca. Sua missão é internacionalizar cada vez mais o time e expandir o senso de pertencimento que os torcedores têm, dentro e fora do Rio de Janeiro.
Segundo Eduardo David, Coordenador do Projeto Embaixadas da Nação, os consulados são de extrema importância para a construção da marca Flamengo. “Ninguém conhece mais a torcida do Flamengo, a região, do que esses torcedores que moram fora do RJ. Então, nada melhor do que você aproximar cada vez mais o torcedor, expandindo sua marca onde eles moram”. O coordenador enfatiza que há todo um processo para que a marca seja expandida cada vez mais por meio dos torcedores.
Com o intuito de aproximar o torcedor rubro-negro, o departamento presta todo apoio aos consulados e embaixadas espalhados pelo mundo. Além disso, dão total visibilidade a esses torcedores. “Quando há alguma ação social pelo Consulado, nós divulgamos nos canais de comunicação do clube, como a FlaTv, matérias para o site e redes sociais, dando total visibilidade”.
Além de apoiar o time diretamente da Europa, as embaixadas também promovem diversas ações beneficentes como doação de sangue para o banco de sangue de Portugal, doação de comidas para pets e feijoada solidária em sua sede.
Carregar a bandeira flamenguista só faz jus ao que a torcida canta em todos os jogos ao redor do mundo: “Mengo! Estou sempre contigo, somos uma nação, não importa onde esteja, sempre estarei contigo”.
Próxima parada, Sydney, Austrália
“A taça Libertadores é obsessão, daria a vida inteira pra ser campeão”. Um dos cantos mais entoados nas arquibancadas do Allianz Parque, estádio do Palmeiras. E depois de quase 22 anos o torcedor palmeirense voltou a sentir a sensação de ver o time disputando uma final de Libertadores, o torneio mais importante e mais almejado pelos clubes na América do Sul.
Foi no dia 30 de janeiro de 2021, em um dos palcos mais emblemáticos da história do futebol. O Maracaña recebeu um clássico entre gigantes, em plena decisão de Copa Libertadores. Breno Lopes, o herói improvável, de cabeça, decretou a vitória alviverde no final da partida. Palmeiras 1x0 Santos. A obsessão se transformou em glória eterna.
O Maracaña foi pintado de verde, mas não pulsou como o esperado, o momento de pandemia atrapalhou a comemoração da torcida no estádio, mas não impediu a festa do outro lado do mundo, na Austrália.
250 pessoas dentro de um barco no Oceano Pacífico representavam o consulado Palmeirenses in Sydney, reunidos para celebrar um sentimento único, compartilhado em todas as partes do mundo. “Foi na emoção, foi muito marcante, não só pra quem organizou, mas pra todo mundo que estava no barco, inclusive pros gringos que estavam trabalhando no barco, eles nunca tinham visto aquilo na vida. A paixão era enorme, era gente em cima da mesa chorando, ajoelhada, se abraçando, foi emocionante. Um episódio tão importante na nossa história que virou filme”, conta Vinni Dias, diretor do consulado Palmeirenses in Sydney.
Atualmente o time conta com mais de 165 consulados, sendo 22 internacionais, com a ideia de fortalecer cada vez mais o laço entre os seus torcedores e expandir para o mundo a marca Palmeiras. O clube conta com uma estrutura organizada e um processo rigoroso na abertura dos consulados. Para se tornar cônsul, é necessário que o palmeirense candidato seja Sócio do Interior, maior de 21 anos de idade, resida fora da cidade de São Paulo, esteja em dia com as suas contribuições e seja aprovado pela diretoria do Departamento de Interior. Além disso, o postulante a cônsul deve apresentar um plano de ação para sua região de atuação e estar disposto a representar o clube em sua cidade.
“Contamos composta por 1 diretor, 4 diretores adjuntos, 3 colaboradores, 2 funcionárias e 1 menor aprendiz. Buscamos uma padronização de algumas situações e o cônsul, a partir do momento que ele se torna responsável, temos que entender que ele é um dirigente do time naquela localidade, é um braço do Palmeiras que vai deixar um pouco o papel de ser torcedor para pensar como um dirigente. O trabalho é sério e precisa ser bem feito”, ressalta Tarso Gouveia, Vice-Presidente do Palmeiras.
É uma ação voluntária, que precisa ser realizada com entrega e amor à camisa, sempre com o intuito de elevar a marca do clube ao redor do mundo. “Enquanto estivermos aqui, não vamos parar de plantar Palmeiras”, finaliza Paulo Estevão, Diretor Adjunto de Departamento Interior da equipe paulista.
Corinthians joga, eu vou
Na final do Mundial de Clubes de 2012, o mundo pôde conhecer a fervorosa e apaixonada Gaviões da Fiel. Criada em 1969, a torcida organizada do Sport Club Corinthians Paulista possui mais de 30 milhões de “loucos” e conta com 10 subsedes: 9 no Brasil e 1 no Japão, além de 15 representações da Fiel Torcida espalhadas pelo mundo. A Gaviões Japão surgiu em 2005, após uma longa reunião com a sede principal, no Brasil. A conversa ocorreu para que os integrantes da organizada no Japão pudessem usar os artigos oficiais da torcida, além de carregar seu nome em eventos oficiais fora de seu país de origem.
As reuniões acontecem na província de Aichi-ken, onde há uma grande concentração de brasileiros. A atração desses torcedores é feita através das redes sociais como Facebook e Instagram. “Divulgamos tudo em nossas páginas: churrasco de arquibancada, eventos beneficentes para arrecadar alimentos, fraldas, essas coisas que a comunidade necessita e entram em contato com a gente. Tentamos nos mobilizar e fazer alguma coisa para ajudar”, diz Dinho Santos, torcedor e associado da Gaviões Japão.
Dia 16 de dezembro de 2012. Final do Mundial de Clubes entre Corinthians e Chelsea, em Yokohama, Japão. O timão já havia feito uma campanha extraordinária na Libertadores daquele ano, com lotação máxima no Pacaembu. Seria possível trazer a mesma quantidade (ou até mais) de torcedores para o outro lado do mundo? A resposta é: sim! A invasão corinthiana aconteceu graças às recomendações da organizada no país. “Em 2012 a gente foi ponto de referência aqui. Postamos vários tópicos, acho que foi no Facebook da torcida, sobre como a galera deveria se comportar aqui no Japão. Porque aqui a lei funciona, não queríamos problema para ninguém” contou Ronaldo Ishigaki, líder da Gaviões Japão.
A cultura asiática no quesito torcida é muito diferente da brasileira. Foi possível observar esse ponto nitidamente quando o clube levou mais de 60 mil torcedores ao estádio, na final mundial. Quando questionado sobre como os japoneses reagem com a festa corinthiana no país, Ronaldo fala que o povo fica um pouco assustado: “Os japoneses ficam assustados, mas não na parte negativa. Assustados porque nunca viram algo, como aconteceu em 2012. O pessoal ficou tipo assim: O que é isso? O que está acontecendo? Ainda mais quando se falava que atravessaram o mundo só pra ver o Corinthians jogar. A galera enfrentou 24 horas de avião, às vezes até mais dependendo da órbita que faz”.
“Doutor, eu não me engano. Meu coração é Corinthiano” é o que canta a torcida alvinegra. O sentimento de levar as cores do clube para o outro lado do mundo vai muito além dessa paixão pelo clube. “O sentimento de fazer parte e carregar as cores da torcida para outro lado do mundo é um sentimento de muita responsabilidade. Com certeza nós amamos o Sport Clube Corinthians Paulista. É um sentimento de amor, de responsabilidade. É um sentimento inexplicável. Você vive aquilo. Quando nos encontramos para assistir a um jogo ao vivo e o Corinthians ganha, por mais que estejamos juntos ali, estamos reunidos e assistindo pela televisão. Vendo os irmãos na arquibancada, cantando os 90 minutos, demonstrando raça e atitude dentro de campo. Para nós, isso é uma realização e nos faz pensar que vale muito a pena a caminhada." desabafa Dinho.
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